Raptados. O mistério dos estrangeiros que a Coreia do Norte fez desaparecer
Megumi vinha do badminton quando foi levada. Won apanhou um voo para Seul e nunca mais regressou. Como eles, outros milhares foram raptados pela Coreia do Norte. Estas são as suas histórias.
Cátia Bruno Observador, 9 junho 2018
Não era suposto Hwang Won ter embarcado naquele voo da Korean Airlines, a 11 de dezembro de 1969. Era suposto o produtor de televisão sul-coreano ter um dia de trabalho normal, mas um imprevisto de última hora de um colega fez com que lhe calhasse a si a tarefa de viajar da sua cidade de Gangneung, na costa oriental da Coreia, até à capital Seul. Mal Won imaginava que não iria regressar — e que a sua mulher e os seus dois filhos, um rapaz de apenas dois anos e uma bebé de três meses, não o voltariam a ver.
"´E claro que não tenho memórias do meu pai, mas quando era pequeno lembrava-me dele", diz esse rapaz de dois anos, agora um homem de 50, ao Observador. "A minha mãe conta que quando eu era pequeno estava sempre a perguntar: 'Quando é que o pai volta?' Ela dizia que o meu pai estava numa viagem de negócios na América e que voltava no Natal. Todos os anos, eu esperava pelo Natal cheio de esperança. Mas ele nunca regressou", resume o filho, Hwang In-cheol. O rapaz só soube o que tinha acontecido ao pai alguns anos depois, quando um tio lhe revelou a verdade.
Hwang Won não regressou porque, crê a família, está impedido de regressar pelo regime da Coreia do Norte, para onde foi levado. O voo da Korean Airlines onde Hwang Won seguia naquele dia foi desviado por um agente secreto de Pyongyang que ia a bordo, Cho Chang-hee, e levado para Hamhung, no Norte. Os 50 passageiros e os membros da tripulação foram retidos, levados depois para Pyongyang, interrogados e por fim "doutrinados" — ou seja, colocados em aulas onde lhes era dada a conhecer a Juche, filosofia central do regime norte-coreano. Dois meses depois, 39 dos passageiros foram autorizados a regressar para junto das suas famílias. Hwang Won foi um dos que ficaram para trás, juntamente com o piloto, um médico, um jornalista e outros sul-coreanos com profissões qualificadas. Hwang In-cheol crê que o pai foi impedido de regressar porque os seus conhecimentos técnicos de televisão seriam valiosos.