Duas mulheres, duas Américas de costas voltadas Kim, filha de uma operária e de um sindicalista, apoia Trump. Lara, criada nos calmos subúrbios de uma cidade republicana, votou Clinton. São os dois rostos de um país que não consegue fazer as pazes.
Cátia Bruno Observador, 10 novembro 2017 Em Williamsport e Wilkes-Barre, Pensilvânia, EUA
Kimberly Woodrosky votou sempre em candidatos democratas à presidência. Walter Mondale na sua primeira eleição, quando tinha 21 anos. Bill Clinton das duas vezes, "claro". Al Gore? Check. John Kerry? Também. Barack Obama? "Votei pois, ele falava muito bem e o facto de poder ser o primeiro Presidente negro representava uma oportunidade tremenda para muitas pessoas.
Mas, chegada a altura da reeleição de Obama, Kim recuou. Pela primeira vez desde os seus 20 anos, esta habitante de Wilkes-Barre ficou em casa numa eleição presidencial. "Ele acabou por não ser aquilo que eu esperava", resume. Foi preciso chegar a 2016 para um candidato renovar a sua fé nos políticos — um candidato chamado Donald Trump, vindo do Partido Republicano, uma força política que nunca antes produzira um candidato que agradasse a esta mulher de 54 anos.
Nem a Kim, nem à maioria dos habitantes de Wilkes-Barre. A sede do condado de Luzerne, encaixada no vale de Wyoming, foi em tempos um centro económico do industrializado nordeste da Pensilvânia. A descoberta de minas de carvão no século XIX atraiu milhares de trabalhadores para aquela que ficou conhecida como "a cidade-diamante". A indústria mineira desenvolveu-se de tal forma na região — Scranton, a "cidade-elétrica" onde nasceu o pai de Hillary Clinton, fica a meia hora de carro — que o vale se tornou uma peça essencial da Cintura do Aço, a área que se estende da Pensilvânia até à ponta do Wisconsin engolindo todo o Ohio e grande parte do Michigan. Foi também aí, nesse cinturão industrial, que se desenvolveram os movimentos sindicais dos operários, emprestando aos democratas grande parte do apoio destas classes trabalhadoras.